quinta-feira, 9 de agosto de 2012

os homens de anizestão - prólogo

ao ouvir as palavras "sociedade moderna", não se pode deixar de imaginar todo o tipo de automatismos para facilitar a vivência de uma espécie como a nossa. não só procuramos máquinas de trabalho bruto, para substituírem o nosso esforço muscular, como também queremos a designada inteligência artificial, que venha poupar a nossa querida matéria cinzenta.
o crescimento de uma sociedade moderna, nestes termos, é suportado pela produção em massa de todo o tipo de bens e serviços que, sem tais automatismos, seria totalmente insuportável. além disso, são económicamente viáveis, programáveis a gosto e não apresentam os defeitos de um organismo frágil como o nosso.
existe a ideia de que seres inteligentes como nós são o culminar da evolução, principalmente pela capacidade de criar máquinas de replicação. mas travar a evolução é impossível, há sempre algo a melhorar e defeitos para eliminar.
o que nos torna diferentes e tão especiais? a inexplicável capacidade de sentir coisas tão abstractas como a compaixão, pena, alegria ou tristeza. é, também, a nossa maior fraqueza. existe uma razão porque se desenvolvem armas cada vez mais tecnologicamente avançadas, algumas até com inteligência artificial, mas nenhuma com capacidades empáticas. isso seria criar um paradoxo, um instrumento redundante. se temos problemas em magoar os outros, vamos atribuir essa tarefa a coisas emocionalmente inertes. evoluímos da forca para a guilhotina, passando pela câmara de gás e a cadeira eléctrica para chegarmos à injecção letal, como forma de aplicar uma pena capital. porque o fizemos? certamente, não foi a pensar no homem ou mulher que tem os segundos contados, mas nos espectadores que, apesar de apreciarem o espectáculo, não se sentem tão bem em relação à personificação da morte através do corpo do condenado. podemos pensar em mais um exemplo, em relação aos seres que consideramos inferiores. se atribuíssemos sentimentos aos instrumentos utilizados nos matadouros, incorríamos no risco de estes se recusarem a fazer o seu trabalho.
a inteligência artificial tem como objectivo principal a simulação da inteligência da espécie criadora e, talvez até, criar a capacidade de fingir sentimentos, para ser mais fácil interagir com essas máquinas. no entanto, nunca iremos realmente transmitir sentimentos reais a algo que pretendemos que efectue um trabalho que não desejamos para nós. fariam greves, formariam sindicatos e criariam robôs que trabalhassem por eles. é um ciclo redundante e que a evolução tende a evitar.
a sociedade moderna irá condenar-se a ela própria a transmitir todo o seu legado a seres artificiais, mais perfeitos e que olharão para os seus criadores como essa sociedade encarou as espécies inferiores que estiveram no ramo da sua evolução.