o poeta canta os seus azares
com a manha que lhe apetece
e, se vierem aos pares,
acima de catástrofes os enaltece.
o poeta é um homem amargo,
que sofre pelo prazer de sofrer,
a felicidade é só um embargo
à sua vontade de escrever.
o poeta é uma página branca
que anseia por inspiração
e, do lado de fora, tranca
o que lhe vai no coração.
o poeta não sabe sentir,
finge o que os outros sentem
e escreve bem, a mentir,
os sentimentos de outrem.
o poeta morre ignorante
numa poça da sua apatia,
sem saber que o importante
é ignorar a agonia.
o poeta tem uma valsa,
um ritual para escrever,
quando a tristeza é falsa
mais vale deixar morrer.