sexta-feira, 12 de setembro de 2014

tudo é melhor contigo

se nas rosas surge um melhor aroma,
os frutos são bem mais adocicados —
e é assim que, p'ra mal dos meus pecados,
tudo soa bem p'la voz do teu idioma.

a chuva que cai quando não estás
e a lua que emprega o seu melhor véu negro
são os sintomas de que não me alegro —
nessa ausência, não encontro paz.

aqui, anseio p'la tua vinda anunciada
que, de bem cedo, me roubou o sono
como o calor frio de uma madrugada.

esse coração teu que vem com dono
nunca te impediu de ser tão amada
por quem acha que mereces um trono.

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

é mais fácil amar

é mais fácil amar que ser amado,
dar tudo e ter em troca apenas nada
da mulher que, p'ra outro, foi guardada
cujo nome fica p'ra ser sonhado.

mais vale deixar, não correr atrás,
que tropeçar com os trunfos na mão,
sabendo que o que vai no coração
em ocasiões raras satisfaz.

quem me dera poder morrer faminto,
mas esta fome não me quer matar
o corpo que tenho, nem o que sinto.

nunca tive vontade de te amar,
mas foste capaz de activar o instinto
que, p'ra sempre, me há-de atormentar.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

carta de engate

escrevi uma carta a ninguém,
que enviei sem destinatário,
na esperança que surja alguém
cansado de estar solitário.

falei de gostos e desgostos,
pessoas que tive e deixei,
amores imaginários e supostos
pelos quais eu nunca lutei.

enumerei perguntas diversas
num vasto questionário pessoal,
para evitar muitas conversas
que sempre terminam mal.

se o azar ou a fortuna quiser
trazer até mim uma resposta,
que seja de uma boa mulher
ou, pelo menos, bem disposta.

isto da solidão só é bonito
no primeiro segundo apenas,
no segundo já se ouve o grito —
vozes que se fizeram pequenas.

descrevi-me maior que o céu
e mal consigo chegar ao tecto,
esse que vendo não sou eu,
mas leva todo o meu afecto.

imagens minhas não possuo
que, aos outros, não enojem,
então falsas eu construo
e lá me ouvem e não fogem.

a carta em vão foi redigida
da maneira mais eloquente,
com a minha caneta preferida
e um toque de coração quente.

por tantas mãos há-de passar
e nenhumas verão o que tem,
mas agora tenho algo a esperar —
essa resposta que nunca vem.

o amor é contagiosa doença
e, de todas, a que mata mais
com a dor na firme crença
que deixamos de ser mortais.

a nossa alma é-nos arrancada
e perdida, sem par, vagueia
onde só de mão bem dada
sob o céu azul se encadeia.