se for para amar, esse amor já existe -
possivelmente, foi desenhado
muito antes de termos acordado
neste sonho que, em nós, persiste.
esse fluído ilusório e lábil,
escorre pelo espaço entre nós
e segue vagaroso para a foz —
onde termina o que é fácil.
pois é na imensidão do mar
que o amor acaba por se perder
e nós amantes, sem o saber,
nos cruzamos — sem nos cruzar.
esta sentença é de morte,
por sermos estranhos à nascença
quando não há amor que vença
sem uma réstia de sorte.
é o acaso e nada mais
que nos acresce, por fim,
mas eu sei e sei, em mim,
que passou tempo demais.
em encontrar-te, eu fui feliz -
o destino estava traçado,
mas temi-me condenado
neste amor por um triz.
estava escrito, desde o princípio,
e por pouco não se perdeu —
foi um momento, meu e teu,
que passou — como um arrepio.
talvez o acaso só o seja
por acreditarmos que assim o é
e, talvez, um só pouco de fé
baste para que o amor se veja.
revolta-me — isso sim —
todo o tempo em solidão,
soubesse eu de antemão
que seríamos um, no fim.
em toda a verdade digo:
esta espera valeu a pena
e esperaria outra centena,
mas prefiro-a contigo.
domingo, 28 de outubro de 2012
terça-feira, 23 de outubro de 2012
os tangos de maria de fátima
um dia - fatídico dia esse,
entre muitas horas perdidas,
na mente de quem se esquece,
as vistas foram feridas.
já não servem para trabalhar,
são empecilhos redundantes -
outrora fizeram-se chorar
e no rescaldo eram brilhantes.
por cinquenta e seis vezes
contornaram o sol
e suportaram as cruzes
que lançaram o anzol.
reformada - está só
na sua negra invalidez,
não mais sai de alijó -
lá se vai a lucidez.
maria tem um amigo,
nada menos que o melhor,
carrega-o sempre consigo -
vá maria por onde for.
esse amigo que canta
em vozes tão diferentes
conta, ao seu nome de santa,
as novidades das gentes.
maria é maria de fátima
e só o rádio a acompanha
na sua vida de lástima,
no seu vale da montanha.
um tango por dia,
para dançar com a vassoura,
é a única alegria
desta mágoa sem cura.
entre muitas horas perdidas,
na mente de quem se esquece,
as vistas foram feridas.
já não servem para trabalhar,
são empecilhos redundantes -
outrora fizeram-se chorar
e no rescaldo eram brilhantes.
por cinquenta e seis vezes
contornaram o sol
e suportaram as cruzes
que lançaram o anzol.
reformada - está só
na sua negra invalidez,
não mais sai de alijó -
lá se vai a lucidez.
maria tem um amigo,
nada menos que o melhor,
carrega-o sempre consigo -
vá maria por onde for.
esse amigo que canta
em vozes tão diferentes
conta, ao seu nome de santa,
as novidades das gentes.
maria é maria de fátima
e só o rádio a acompanha
na sua vida de lástima,
no seu vale da montanha.
um tango por dia,
para dançar com a vassoura,
é a única alegria
desta mágoa sem cura.
sexta-feira, 19 de outubro de 2012
uma história de aventura, uma demanda eterna
sentei-me um pouco a pensar e calmamente pensava pensando
"a chuva cai e eu tropeço, por estas ruas onde sempre ando."
se eu soubesse, naquele momento, se eu adivinhasse aquele dia
é certo, e mais que certo, jamais tais coisas eu te diria!
um pássaro pairou sobre mim e assustei-o para se afastar,
disse "vil criatura, desaparece! vil criatura, só me dás azar!"
eu choro para dentro: os meus pulmões, em si, colapsam
e eu tusso — esse é o meu choro — pelas mágoas que passam.
são uma forte corrente: as águas de um rio voraz
interminável — inexplicável, jorrá-las não sou capaz.
um azevinho cresceu sobre mim e olhei-o com desdém,
disse "não vês que estou só? não vês que tenho ninguém?"
observo a noite, tão escura como quem esquece
e as estrelas cintilam à esperança que desvanece.
julguei-me conhecedor e mestre dos teus sentidos,
fiz dos sonhos que tiveste objectos oprimidos.
um gato deitou-se sobre mim e enxotei-o de repente,
disse "jamais serei teu amigo! jamais terei um colo quente!"
ainda que depois de morto e por mais morto que esteja,
é o teu corpo — esse teu doce corpo — que este meu corpo deseja.
sou demente — sou sim, certamente — não me sei de outro jeito
e a culpa será — e será, certamente — deste pêndulo que trago ao peito.
um gigante chegou sobre mim e enfrentei-o com coragem,
disse "lembrar-te-ás do vencedor! lembrar-te-ás da minha imagem!"
esta seria a ode — a ode das odes — que eu te dedicaria por escrito,
de quem te ama, de quem te sente, de quem te clama num grito.
a tua sombra — de tantas outras, que em nada são iguais —
é a réstia de uma deusa que se perdeu para os carnais.
um sonho surgiu sobre mim e violei-o sem contenção,
disse "tais coisas eu não mereço! tais coisas, para mim não!"
sinto que o mundo é o cumprir de uma velha sentença,
onde viver é somente o sintoma de uma doença.
se porventura o dia chegar em que nos elevemos ao extremo,
deixa-me declarar "é a falta desse amor que temo."
um desejo refugiou-se sobre mim e rendi-me finalmente,
disse "estás em mim uma vez, estás em mim eternamente!"
se eu soubesse, naquele momento, se eu adivinhasse aquele dia
é certo, e mais que certo, jamais tais coisas eu te diria!
um pássaro pairou sobre mim e assustei-o para se afastar,
disse "vil criatura, desaparece! vil criatura, só me dás azar!"
eu choro para dentro: os meus pulmões, em si, colapsam
e eu tusso — esse é o meu choro — pelas mágoas que passam.
são uma forte corrente: as águas de um rio voraz
interminável — inexplicável, jorrá-las não sou capaz.
um azevinho cresceu sobre mim e olhei-o com desdém,
disse "não vês que estou só? não vês que tenho ninguém?"
observo a noite, tão escura como quem esquece
e as estrelas cintilam à esperança que desvanece.
julguei-me conhecedor e mestre dos teus sentidos,
fiz dos sonhos que tiveste objectos oprimidos.
um gato deitou-se sobre mim e enxotei-o de repente,
disse "jamais serei teu amigo! jamais terei um colo quente!"
ainda que depois de morto e por mais morto que esteja,
é o teu corpo — esse teu doce corpo — que este meu corpo deseja.
sou demente — sou sim, certamente — não me sei de outro jeito
e a culpa será — e será, certamente — deste pêndulo que trago ao peito.
um gigante chegou sobre mim e enfrentei-o com coragem,
disse "lembrar-te-ás do vencedor! lembrar-te-ás da minha imagem!"
esta seria a ode — a ode das odes — que eu te dedicaria por escrito,
de quem te ama, de quem te sente, de quem te clama num grito.
a tua sombra — de tantas outras, que em nada são iguais —
é a réstia de uma deusa que se perdeu para os carnais.
um sonho surgiu sobre mim e violei-o sem contenção,
disse "tais coisas eu não mereço! tais coisas, para mim não!"
sinto que o mundo é o cumprir de uma velha sentença,
onde viver é somente o sintoma de uma doença.
se porventura o dia chegar em que nos elevemos ao extremo,
deixa-me declarar "é a falta desse amor que temo."
um desejo refugiou-se sobre mim e rendi-me finalmente,
disse "estás em mim uma vez, estás em mim eternamente!"
esquisso de
poema rítmico
domingo, 14 de outubro de 2012
lembro-me de ti
hoje, senti um frio profundo, um tiritar na barriga — hoje, tive saudades tuas. faz-me falta a maneira como me completas: és o leite para os cereais, os tremoços para a cerveja, o atacador para o sapato e o botão da camisa. é possível viver sem ti, mas são dias tristes e vazios. gostava de poder tornar a ouvir o eco do teu riso, a fúria da da tua indignação e o orvalho dos teus olhos. dava tudo o que tenho — roubava e matava — só para te poder segurar, por mais uma noite, nestes braços há muito desabitados. sentei-me a ouvir as músicas que as nossas vozes dissonantes distorciam, com a felicidade de um par de dois. apercebi-me do quão vago é a solidão, como um refrão sem versos e cuja melodia desvaneceu a medo. acostumei-me à tua presença, esse farol que sempre me iluminou o caminho — por mais negro que fosse. não sei estar sem ti, nem consigo imaginar que houve uma vida inteira — até ao dia em que te conheci — repleta da tua ausência. não te posso pedir que voltes, mas lembra-te de mim e de coisas boas que sorrateiramente te façam sorrir. perdi o volante do tempo e dou por mim a admirar a parede branca, vazia como a minha alma. lembro-me de ti.
esquisso de
cartas a ninguém
quinta-feira, 11 de outubro de 2012
elisa
invadiu-me o teu nome,
perfurou-me, assim, a medo.
enquanto a alma se consome,
ele lá se esconde (é segredo).
para quem chegou espontâneo,
sem ter sido convidado,
tornou-se, assim, coetâneo
do meu coração destronado
que ousou clamar pela brisa -
essa bela brisa de verão,
que me pegou pela mão
e sussurrou esse nome... elisa?
cravaram-me a tua face
com a ponta de uma navalha,
a cicatriz quente arrefece
e a velha memória já falha.
percorro o mundo e anseio
um pouco de ti para consertar:
um ténue vislumbre, eu receio,
ser suficiente para me apaziguar.
és musa e poetisa,
escreves-me melhor que ninguém
com esse nome que me fez refém,
esse teu nome... elisa!
um dia, terei coragem,
serei homem novo e grosseiro,
pegar-te-ei na outra margem
e carregar-te-ei o tempo inteiro.
a tua postura é angelical
e esse passear ao som de piano
obriga o tempo a correr mal -
tropeça, está insano!
é pura magia, o que realiza
esse teu bem mais precioso,
esse belo nome pecaminoso -
esse teu nome... elisa.
sentimento novo e incerto:
não sei como hei-de conter
esta vontade de te ter perto,
esta ansiedade de te rever.
são os teus cabelos em onda
a chamar-me, como por sinais -
não sei se me esconda
ou me renda às forças banais.
quando eu te falar: improvisa!
perguntar-te-ei o nome com emaranho,
como se me fosse algo estranho,
esse nome que ecoa... elisa!
vou ultrapassar os versos,
quiçá - não hoje, tenho sono.
um dia, vou ter remorsos
quando sentir o abandono.
não é fácil sair daqui
e ir de encontro à miragem,
com a sensação que perdi
sem passar pela triagem.
uma nódoa negra na camisa,
eu provoco para angariar
uma só desculpa e evitar
esse amado nome: elisa.
perfurou-me, assim, a medo.
enquanto a alma se consome,
ele lá se esconde (é segredo).
para quem chegou espontâneo,
sem ter sido convidado,
tornou-se, assim, coetâneo
do meu coração destronado
que ousou clamar pela brisa -
essa bela brisa de verão,
que me pegou pela mão
e sussurrou esse nome... elisa?
cravaram-me a tua face
com a ponta de uma navalha,
a cicatriz quente arrefece
e a velha memória já falha.
percorro o mundo e anseio
um pouco de ti para consertar:
um ténue vislumbre, eu receio,
ser suficiente para me apaziguar.
és musa e poetisa,
escreves-me melhor que ninguém
com esse nome que me fez refém,
esse teu nome... elisa!
um dia, terei coragem,
serei homem novo e grosseiro,
pegar-te-ei na outra margem
e carregar-te-ei o tempo inteiro.
a tua postura é angelical
e esse passear ao som de piano
obriga o tempo a correr mal -
tropeça, está insano!
é pura magia, o que realiza
esse teu bem mais precioso,
esse belo nome pecaminoso -
esse teu nome... elisa.
sentimento novo e incerto:
não sei como hei-de conter
esta vontade de te ter perto,
esta ansiedade de te rever.
são os teus cabelos em onda
a chamar-me, como por sinais -
não sei se me esconda
ou me renda às forças banais.
quando eu te falar: improvisa!
perguntar-te-ei o nome com emaranho,
como se me fosse algo estranho,
esse nome que ecoa... elisa!
vou ultrapassar os versos,
quiçá - não hoje, tenho sono.
um dia, vou ter remorsos
quando sentir o abandono.
não é fácil sair daqui
e ir de encontro à miragem,
com a sensação que perdi
sem passar pela triagem.
uma nódoa negra na camisa,
eu provoco para angariar
uma só desculpa e evitar
esse amado nome: elisa.
esquisso de
poema rítmico
quarta-feira, 10 de outubro de 2012
cidade
à noite, pela janela vejo
a silhueta desta cidade,
sem vergonha ou vaidade:
espera por um beijo.
escuto palpitantes passos -
são os passos dessa senhora,
que me prometeu, outrora,
perder-se em meus braços.
há ressonância à solta,
gotas de chuva a cair
e o silêncio a fugir
como quem já não volta.
r-r-r-ruído indiscernível
por esta floresta industrial,
cuja atmosfera infernal
causa-me sono impossível.
fecho a janela em vão -
ainda a sinto em redor
e cresce, em mim, o temor
de dormir em solidão.
gente grita e gente brinca,
gente vive nesta cidade
e morre ao chegar à idade -
numa vida que se tranca.
mas ela jamais dorme,
está sempre desperta:
por essa noite deserta,
por essa rua enorme.
esconde, pelos recantos,
as almas que vendeu
para reaver o que era seu:
monumentos e encantos.
não há paz no urbano,
mas lá fervilha a vida -
ora triste, ora divertida -
é o nosso quotidiano.
um dia negar-te-ei,
mas não será em breve -
esta vontade te escreve:
ainda não te explorei.
a silhueta desta cidade,
sem vergonha ou vaidade:
espera por um beijo.
escuto palpitantes passos -
são os passos dessa senhora,
que me prometeu, outrora,
perder-se em meus braços.
há ressonância à solta,
gotas de chuva a cair
e o silêncio a fugir
como quem já não volta.
r-r-r-ruído indiscernível
por esta floresta industrial,
cuja atmosfera infernal
causa-me sono impossível.
fecho a janela em vão -
ainda a sinto em redor
e cresce, em mim, o temor
de dormir em solidão.
gente grita e gente brinca,
gente vive nesta cidade
e morre ao chegar à idade -
numa vida que se tranca.
mas ela jamais dorme,
está sempre desperta:
por essa noite deserta,
por essa rua enorme.
esconde, pelos recantos,
as almas que vendeu
para reaver o que era seu:
monumentos e encantos.
não há paz no urbano,
mas lá fervilha a vida -
ora triste, ora divertida -
é o nosso quotidiano.
um dia negar-te-ei,
mas não será em breve -
esta vontade te escreve:
ainda não te explorei.
esquisso de
poema rítmico
quarta-feira, 3 de outubro de 2012
para a rapariga de cabelos cor-de-sol
agradeço a todo o eterno,
infinito e imensurável,
a paz do meu inferno
e vivência deplorável.
a tua imagem cega-me,
atormenta-me tal doença —
já sonhei ouvir "leva-me,
pelas praças de Florença."
sou eu um simples vulto
e nada mais do que isso:
a sombra de alguém oculto,
petrificado p'lo teu feitiço.
esse feitiço é um olhar,
teus cabelos cor-de-sol —
lá me roubam o respirar
e a voz de rouxinol.
há desejo — eu senti-o,
nas páginas deste conto —
um seixo atirado ao rio
a viajar de ponto a ponto.
meu amor a contra-relógio,
essa solidão é um instante,
só desejo algum contágio
p'ra me veres como amante.
esse contágio será temível —
imploraremos pela morte
e essa morte impossível
só fará o amor mais forte.
encontrar-te-ei, um dia,
à espera d'outro alguém,
com amor em agonia —
por amor que já não tem.
e os teus olhos verdes
afinar-se-ão de azul
pelas águas que perdes
por quem morreu a sul.
se as palavras falassem,
se falassem por mim,
se cedo te encontrassem
pelo cheiro a jasmim...
mas a dor é um lembrete
com os versos da canção —
canta a tua voz: derrete
este meu pobre coração.
salva-me deste render,
que jamais me apaixones!
escolho me esquecer
p'ra que não me abandones!
e este sonho, tão doce,
morre, assim, por inteiro.
a realidade antes fosse
de quem a sonhou primeiro.
isto eu sei, e juro que sei:
o nome que cedo herdaste,
mas não sei se te encontrei
ou se tu me encontraste.
já só queria que o tempo
cavalgasse um caracol,
aprisionando, num momento,
teus cabelos cor-de-sol.
nesse momento, eu vi
e soube desde então:
fiquei, porque me perdi,
amei... porque não?
infinito e imensurável,
a paz do meu inferno
e vivência deplorável.
a tua imagem cega-me,
atormenta-me tal doença —
já sonhei ouvir "leva-me,
pelas praças de Florença."
sou eu um simples vulto
e nada mais do que isso:
a sombra de alguém oculto,
petrificado p'lo teu feitiço.
esse feitiço é um olhar,
teus cabelos cor-de-sol —
lá me roubam o respirar
e a voz de rouxinol.
há desejo — eu senti-o,
nas páginas deste conto —
um seixo atirado ao rio
a viajar de ponto a ponto.
meu amor a contra-relógio,
essa solidão é um instante,
só desejo algum contágio
p'ra me veres como amante.
esse contágio será temível —
imploraremos pela morte
e essa morte impossível
só fará o amor mais forte.
encontrar-te-ei, um dia,
à espera d'outro alguém,
com amor em agonia —
por amor que já não tem.
e os teus olhos verdes
afinar-se-ão de azul
pelas águas que perdes
por quem morreu a sul.
se as palavras falassem,
se falassem por mim,
se cedo te encontrassem
pelo cheiro a jasmim...
mas a dor é um lembrete
com os versos da canção —
canta a tua voz: derrete
este meu pobre coração.
salva-me deste render,
que jamais me apaixones!
escolho me esquecer
p'ra que não me abandones!
e este sonho, tão doce,
morre, assim, por inteiro.
a realidade antes fosse
de quem a sonhou primeiro.
isto eu sei, e juro que sei:
o nome que cedo herdaste,
mas não sei se te encontrei
ou se tu me encontraste.
já só queria que o tempo
cavalgasse um caracol,
aprisionando, num momento,
teus cabelos cor-de-sol.
nesse momento, eu vi
e soube desde então:
fiquei, porque me perdi,
amei... porque não?
esquisso de
poema rítmico
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