quarta-feira, 10 de outubro de 2012

cidade

à noite, pela janela vejo
a silhueta desta cidade,
sem vergonha ou vaidade:
espera por um beijo.

escuto palpitantes passos -
são os passos dessa senhora,
que me prometeu, outrora,
perder-se em meus braços.

há ressonância à solta,
gotas de chuva a cair
e o silêncio a fugir
como quem já não volta.

r-r-r-ruído indiscernível
por esta floresta industrial,
cuja atmosfera infernal
causa-me sono impossível.

fecho a janela em vão -
ainda a sinto em redor
e cresce, em mim, o temor
de dormir em solidão.

gente grita e gente brinca,
gente vive nesta cidade
e morre ao chegar à idade -
numa vida que se tranca.

mas ela jamais dorme,
está sempre desperta:
por essa noite deserta,
por essa rua enorme.

esconde, pelos recantos,
as almas que vendeu
para reaver o que era seu:
monumentos e encantos.

não há paz no urbano,
mas lá fervilha a vida -
ora triste, ora divertida -
é o nosso quotidiano.

um dia negar-te-ei,
mas não será em breve -
esta vontade te escreve:
ainda não te explorei.